domingo, 27 de fevereiro de 2011

Amanhecer

A manhã nasce e me comovo ao contemplar a cidade vazia e quieta. É domingo e todos dormem, exceto eu e os pássaros. O sol se deita devagar sobre os telhados, como se não quisesse fazer barulho, como se não quisesse brilhar demais e acordar os trabalhadores, deuses que constroem esse mundo e que merecem descansar no sétimo dia.
Apenas as árvores quebram a imobilidade da manhã, mexendo-se lentamente no vento fresco, se despedindo da madrugada. Não há nenhuma janela aberta, nenhuma luz acesa, nem os cães latem. Somente em minha cozinha o cheiro do café desperta os sentidos. O gosto amargo e quente, amigo de todas as manhãs, me acompanha na contemplação da cidade adormecida.
Mas de repente um carro passou na rua. Um carro veloz e barulhento. Depois um cão latiu. E finalmente uma janela se abriu.
E a manhã não era mais apenas minha.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Reflexões a partir da minha janela - parte I

Um vento soprou bem forte e varreu a chuva que se formava. Ainda vejo pela janela os resquícios da ex-tempestade - algumas nuvens cinzas que ficaram para trás, insistindo ainda em ameaçar a tarde de sol que adentra a noite no horário de verão.
Penso que às vezes a vida é assim: grandes tempestades se anunciam. A gente sofre por antecipação, humanos tolos que somos. "Mas eis que vem a roda vida e carrega" a tempestade pra lá, parodiando Chico Buarque. Mesmo assim ficam as nuvenzinhas teimosas. Aquela sensação de que o problema não pode ser um aborto, morrer antes de nascer, se resolver antes mesmo de dar aquela dor de estômago. Aquela sensação de que o vento pode trazer a tempestade de volta.
Aí não se aproveita o sol que ainda resta, porque a gente fica pensando na tempestade que podia ter caído.