Primeira semana de aula. Apesar de o corpo reclamar por
acordar tão cedo (levantar antes do sol nascer não é natural, minha gente!),
sinto-me feliz em retornar à escola. O abraço carinhoso daqueles que já são
meus alunos há um ano ou mais e os olhares curiosos dos alunos novos sempre me
trazem alegria e entusiasmo. Mas o dos alunos parece acabar quando a gente fala
três famigeradas palavras: Lista de leitura.
Todo ano eu indico de 6 a 8 livros que os alunos devem ler
ao longo do ano. Esta carga de leitura não ultrapassa a de 1 livro por mês.
Sim, 1 livro em 30 dias. Não me parece muito, ao contrário, eu sempre li mais
de um livro por mês desde os meus 12 anos... Mas para vários dos meus alunos,
ler um livro por mês parece um fardo terrível, para não dizer impossível!
Geralmente, há dois tipos de lamento: o primeiro é o dos preguiçosos.
Aqueles que não querem ler nem uma página por mês, quanto mais um livro. Com
esses eu nem argumento. O segundo tipo é o dos rebeldes: geralmente são pessoas
que gostam de ler, mas que se recusam a aceitar aquela lista específica de
livros. Pergunto: vocês conhecem esses livros? Vocês conhecem esses autores?
99,9% diz que não, mas mesmo assim não gosta. Assim não dá, queridos! Vamos
parar com esta história de não gostar de espinafre sem nunca ter comido... A
motivação verdadeira por trás desta recusa é: não gostamos simplesmente porque
a escola manda e professor diz que é legal. Se é escolar, tem que ser chato.
Esse é o raciocínio? Argumento questionável, hein?
Porém, às vezes a gente escuta um argumento melhor e
reconhece que ele merece uma resposta. Nesta semana, uma aluna me disse:
“Professora, eu gosto de ler, não tenho nada contra ler um livro por mês, leio
até mais. Mas por que você não deixa a gente escolher os livros?”. Pela classe,
rumores de aprovação que logo viraram uma balbúrdia... Viva a liberdade! Abaixo
a ditadura na aula de literatura (até rimou!)! Pelo fim da opressão dos livros
escolhidos pela professora! Achei que era melhor argumentar antes que eles
continuassem seu ímpeto revolucionário.
Não é de hoje que os alunos me questionam sobre isso. Por um
lado, seria muito interessante que os alunos pudessem escolher suas leituras,
pois isso poderia aumentar seu interesse pelos livros e sua adesão às
atividades propostas nas aulas. Por outro lado, essa experiência poderia
limitar muito a atuação do professor no sentido de ampliar as habilidades e o
repertório de leitura dos alunos. Como? É simples: há alguns anos, fiz esta
experiência democrática, deixei que os alunos sugerissem quais livros leríamos
durante o ano. Resultado: uma lista de bestsellers
juvenis e histórias em quadrinhos.
Não estou aqui dizendo que estes livros são ruins,
principalmente porque o adjetivo “bom” ou “ruim” deve sempre ser seguido da
palavra “para”. Ou seja, estes bestsellers podem ser narrativas ótimas,
divertidas, mas a maioria dos que foram sugeridos, naquela ocasião, eram livros
que não traziam uma linguagem interessante (ao contrário, ela era facilitada ao
máximo), nem temas relevantes, que realmente enriqueceriam nossas aulas.
Portanto, em minha defesa de que o professor deve escolher o
que seus alunos vão ler, apresento dois pontos principais. Em primeiro lugar, é
preciso que os livros desafiem minimamente os alunos para que eles ampliem sua
capacidade de leitura. Porém, infelizmente, ao escolher o que vão ler, a
maioria dos alunos não quer de forma alguma sair da sua zona de conforto. Os
livros que escolho, geralmente, oferecem uma estrutura e uma linguagem que vão
obrigar até os alunos que têm o gosto e o hábito da leitura a pensar, a se
esforçar um pouco. Pode parecer ruim, a princípio, mas os ganhos são muitos.
Em segundo lugar, considero importante que eu indique livros
que meus alunos dificilmente escolheriam. Sim, estou aqui para ampliar o
cardápio, apresentar novos sabores. Se nós, professores de literatura, só
oferecermos ao aluno o livro que ele mesmo escolheria na estante da livraria, o
que estamos acrescentando na formação dele?
Além disso, a sociedade, os PCNs, o ENEM, os vestibulares
nos impõem a missão de apresentar aos alunos uma lista de “leituras
obrigatórias”, “autores clássicos” etc... Para além da questão da simples
cobrança: se um autor ultrapassou seu tempo, teve centenas de edições ao longo
dos séculos, não vale a pena a gente conferir o que ele escreveu? Como eu digo
para meus alunos quando eles torcem o nariz para o Machado de Assis: “Dá uma
chance para o Joaquim Maria, vai...”. Às vezes, os livros que a gente pensa que
devem ser uma chatice, só porque foram indicados pela escola, podem trazer
agradáveis surpresas!
P.S. – Dedico este texto a todos os meus alunos,
principalmente aos leitores apaixonados e questionadores!