Um deles foi uma série de propagandas intitulada "Hope ensina", da famosa rede de roupa íntima feminina, encenada por, nada mais, nada menos, Gisele Bündchen. Nos anúncios, a musa das passarelas ensina a nós, mulheres, como se deve dar notícias aos maridos. Confira alguns:
Só por apresentar uma mulher considerada símbolo de beleza e sensualidade, em roupas íntimas, a propaganda já chamaria a atenção, mas chamou a minha por seu implícito conteúdo machista, velado, como na maioria das vezes, pela perspectiva do humor. Felizmente, essa percepção não foi apenas minha (esse país tem muitas mulheres inteligentes!), pois a propaganda foi suspensa nos meios televisivos desde a a semana passada, e está sob processo do CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), depois de manifestação de repúdio da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM).
Quando acontece algo do gênero - a suspensão de uma propaganda por questões éticas - é interessante observar, em sites da web, os comentários que seguem as reportagens que a noticiam. Em vários sites, li coisas do tipo "Não tem nada a ver, a propaganda só é engraçada, não deprecia a mulher". Um deles dizia que "feministas hardcore estavam deturpando a propaganda, criando preconceitos", seguido por outro que dizia que "o que as feministas estavam precisando é de Hope". A maioria dos comentários se mostrava contrária às manifestação da SPM e do CONAR, ou sob alegação de censura, ou de que as mulheres estavam "viajando", pois a propaganda "enaltecia a beleza da mulher, ao invés de ofender".
Que me desculpem os ingênuos de plantão (aqueles que não veem maldade em nada e que riem de tudo), mas os anúncios têm evidente conteúdo depreciativo à mulher. Reforçam os estereótipos da mulher consumista (que estoura o cartão de crédito do marido), que dirige mal (bate o carro do marido repetidas vezes) - colocando a imagem da dependência da mulher em relação ao homem - e que, incapaz de bons argumentos, tem que usar o corpo para convencê-lo. Esse sem dúvida é o estereótipo mais perverso: desprovida de bens (seja a conta bancária, o carro ou a inteligência), resta à mulher brasileira utilizar o sexo como arma de convencimento.
Tudo isso aprendemos em livros, novelas, propagandas, piadas - imagens poderosas que povoam nosso inconsciente coletivo. Daí o perigo de não percebermos que se trata sim de mais uma forma sutil de depreciação da mulher. A grande arma do machismo contemporâneo é a falácia de que ele não existe, apenas porque as mulheres podem trabalhar fora e votar. Conquistas importantes, sem dúvida, mas que não são suficientes.
Devemos aprender sim com as propagandas - sobretudo a questioná-las. Que fique claro que não sou contra a publicidade. Ela não cria preconceitos, ela apenas reflete os que existem na sociedade. E como qualquer texto, deve ser lida criticamente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário