Sabe aqueles quadros compartilhados à exaustão no Facebook,
que colocam “Como meus amigos me veem”, “Como minha família me vê”, “Como eu me
vejo” para várias profissões ou situações? Fiquei pensando em como seria um
quadro destes que retratasse o escritor.
Há reações diversas quando declaramos para alguém sermos
escritores, mas frequentemente ocorre uma certa perplexidade – para não dizer
mesmo que alguns se sentem diante de um E.T.. Às vezes, percebe-se alguma
deferência: as pessoas nos parabenizam, e não raro falam que gostam de ler, ou
sobre a importância da leitura, mas se esquivam delicadamente quando mostramos um exemplar do livro, com medo de
que sejam obrigados a comprá-lo.
Outra reação comum é um olhar de piedade, de complacência,
como se dissesse “Puxa, coitado de você que sonha em viver de literatura”. Foi
esse o olhar de um professor de ensino médio, quando eu lhe disse, um dia, que
eu escrevia poemas e queria ser escritora. Não contente com o olhar e para não
deixar dúvidas, ele completou: “Você tem vocação para faquir?”.
Frequentemente, também escuto, ao dizer que sou escritora:
“Que legal! Eu faço oficina de origami e dança de salão.” E então você
delicadamente explica que não se trata de um hobby, de um passatempo. Nos últimos meses, fui chamada a dar
palestras para jovens e professores e uma pergunta que apareceu bastante foi:
“Além de escrever, você trabalha?” E as pessoas perguntam isso a sério, porque
no imaginário geral da nação, escrever não é um trabalho, nem ser escritor é
profissão.
E na contramão deste pensamento, estão aquelas pessoas que
acham que você está ganhando muito dinheiro. Aquelas que acham o livro uma
fortuna, mas não pensam que, para que ele chegue à estante da livraria, além do
escritor, várias pessoas trabalharam: o editor, o ilustrador, o diagramador, o
revisor, funcionários da gráfica, o divulgador, o distribuidor, o vendedor...
Aquelas que reclamam que seu livro está muito caro, mas que gastam o dobro sem
reclamar para comprar qualquer outra coisa. Isso quando elas não pedem um livro
de graça, sem pensar que o autor, muitas vezes, está pagando para trabalhar,
pois, além de escrever seu livro, custeou sua edição do próprio bolso. Ou, se
não o fez, não está ganhando mais do que alguns centavos por exemplar vendido.
E para terminar com a “pureza das respostas das crianças”,
uma vez eu estava fazendo contação de histórias em uma escola, e um menino me
perguntou se eu estava ganhando bastante dinheiro com o meu livro. Eu disse: “Não,
apenas escritores que são celebridades e vendem muitos livros conseguem
realmente se sustentar com isso”. Ele me olhou estupefato e disse: “Uai, então
por que você escreve livro?”.
Essa é uma pergunta que eu já me fiz muitas vezes. Diante da
pouca valorização do escritor pela sociedade (e não me venham com aquele
blábláblá de que você valoriza o escritor se você vai ao lançamento do livro,
mas não compra porque vai tentar fazer o download de graça depois); diante da
dificuldade de publicar em um mercado editorial que frequentemente vai pensar
primeiro na vendagem do livro e depois na sua qualidade artística; diante da
aventura de ter que conciliar a criação e a escrita com tantos outros afazeres
que pagam as minhas contas, eu já me questionei em por que continuar escrevendo.
Mas não parei. E só Drummond conseguiu me dar uma resposta. É que meu verso (ou minha crônica, meu conto, meu romance) é minha cachaça. E todo mundo tem a sua cachaça.
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